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Crise e mal-estar em educação: reflexões
por
Osvaldino Marra Rodrigues
A educação é um fenômeno eminentemente humano, pertence à esfera da condição humana e não se desenvolve às margens das sociedades, mas emerge destas. Por conseqüência, todas as mudanças ocorridas nas sociedades afetam indelevelmente a ação pedagógica, seja na compreensão dos fenômenos sociais, seja na compreensão sobre o ser humano; a educação é, pois, um fenômeno complexo e envolve todos os campos do saber humano. Além disso, não há uma educação, mas várias, tantas quantas as sociedades humanas. Por conseguinte, todos os procedimentos pedagógicos devem levar em consideração essa multiplicidade cultural e antropológica, pois elas constituem diferenças importantes e substanciais na forma como nos posicionamos no mundo
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A educação e o Iluminismo
Cabe
ressaltar que, sob muitos aspectos, ainda caminhamos a passos de
tartaruga, pois nossos fundamentos pedagógico-epistemológicos
estão emperrados por inúmeros preconceitos,
anacronismos que impedem o avanço efetivo da educação.
Dentre os anacronismo, o fato de estarmos muitos presos ao projeto
oriundo do Iluminismo, projeto esse que pode ser caracterizado pela
dominação implacável da natureza. E aqui surge
um problema vital, pois esse projeto está voltando-se contra o
próprio ser humano na medida em que ele também é,
em última instância, natureza. Ou seja, o projeto do
“Iluminismo, com efeito, é autodestrutivo, segundo
Horkheimer e Adorno, porque em sua origem se configura como tal sob o
signo do domínio
sobre a natureza. E é autodestrutivo porque este, o domínio
sobre a natureza, segue, como o Iluminismo mesmo, uma lógica
implacável que termina voltando-se contra o sujeito dominante,
reduzindo sua própria natureza interior e, finalmente, a si
mesmo, a mero substrato de domínio. O processo de sua
emancipação frente à natureza externa se revela,
desse modo, ao mesmo tempo como processo de submissão da
própria natureza interna e, finalmente, como processo de
regressão à antiga servidão sob a natureza. O
domínio do homem sobre a natureza leva consigo,
paradoxalmente, o domínio da natureza sobre os homens.”
Esse
paradoxo é exposto no início da Dialética do
Esclarecimento; de acordo com Horkheimer e Adorno, no “sentido
mais amplo do progresso do pensamento, o esclarecimento tem
perseguido sempre o objetivo de livrar os homens do medo e de
investi-los na posição de senhores. Mas a terra
totalmente esclarecida resplandece sob o signo de uma calamidade
triunfal.”
A
começar pela discriminação de gênero, cuja
origem remonta ao projeto de domínio da natureza. Nas palavras
de Max Horkheimer e Theodor Adorno, numa crítica à
concepção racional da genética das sociedades,
baseadas na força e brutalidade típicas dos homens
“fundadores de sociedades”, a mulher é comparada à
própria natureza, que tem de ser domesticada e submetida:
As
mulheres “não têm uma participação
própria na valentia da qual nasceu dita civilização.
O homem deve sair à vida hostil, deve atuar e lutar [wirken
und streben]. A mulher não é sujeito [Die Frau ist
nicht Subjekt]. Não produz, mas cuida dos produtores:
documento vivo dos tempos já desaparecidos da economia
doméstica fechada. A divisão do trabalho, realizada e
imposta pelo homem, foi pouco propícia a ela: a converteu na
encarnação da função biológica, em
imagem da natureza, em cuja opressão pôs esta
civilização seu título de glória. Dominar
sem limite a natureza, transformar o cosmos num imenso campo de caça:
tal foi o sonho de milênios ao qual se conformou a idéia
do homem na sociedade viril. Este era o sentido da razão do
qual o homem se orgulharia. A mulher era a mais pequena e mais débil;
entre ela e o homem subsistia uma diferença que a mulher não
podia superar, uma diferença imposta pela natureza: o mais
vergonhoso e humilhante que se possa imaginar na sociedade viril. Ali
onde o domínio da natureza é a verdadeira meta, a
inferioridade biológica constitui o estigma por excelência:
a debilidade impressa pela natureza, a cicatriz que convida à
violência.
Esse
mesmo projeto de dominação está presente em
todas as empreitadas marítimas do período das grandes
navegações marítimas que, dentre os inúmeros
objetivos, tinham a incumbência de expandir os territórios
dos países dominadores. É interessante constatar na
historiografia colonialista como funcionava a mente do conquistador.
Observe, a respeito, uma crônica de Pedro Gandavo a respeito, e
o espanto do mesmo diante dos fatos observados nesta terras
brasilis:
Já
que tratamos da terra e das coisas que nela foram criadas para o
homem, razão me parece que demos aqui notícia dos
naturais dela, a qual, posto que não seja de todos em geral,
será especialmente daqueles que habitam pela costa e, em
parte, dos que estão pelo sertão adentro muitas léguas,
com quem temos comunicação. Os quais ainda que estejam
divisos, e haja entre eles diversos nomes de nações,
todavia na semelhança, condição, costumes e
ritos gentílicos todos são um. E se de alguma maneira
diferem nesta parte, é tão pouco que se não pode
fazer caso disso, nem particularizar
coisas semelhantes ente outras mais notáveis que todos
geralmente seguem, como logo direi. Esses índios são de
cor baça e cabelo corredio; têm o rosto amassado e
algumas feições dele à maneira de chins. Pela
maior parte são bem-dispostos, rijo e de boa estatura; gente
muito esforçada e que estima pouco morrer, temerária na
guerra e de muito pouca consideração. São
desagradecidos em grã maneira, e mui desumanos e cruéis,
inclinados a pelejar e vingativos em extremo. Vivem todos mui
descansados sem terem outros pensamentos senão comer, beber e
matar gente, e por isso engordam muito, mas com qualquer desgosto
tornam a emagrecer. E muitas vezes, pode neles tanto a imaginação,
que se algum deseja a morte, ou alguém lhes mete na cabeça
que há de morrer tal dia ou tal noite, não passa
daquele termo que não morra. São mui inconstantes e
mudáveis; crêem de ligeiro tudo aquilo que lhes
persuadem, por dificultoso e impossível que seja, e com
qualquer dissuasão facilmente o tornam logo a negar. São
mui desonestos e dados à sensualidade, e assim se entregam aos
vícios como se neles não houvera razão de
homens, ainda que todavia em seu ajuntamento os machos com as fêmeas
têm o devido resguardo, e nisto mostram ter alguma vergonha. A
língua que usam, por toda costa, é uma, ainda que em
certos vocábulos difere em algumas partes, mas não de
maneira que se deixem uns aos outros de entender e isto até a
altura de vinte e sete graus, que daí por diante há
outra gentilidade de que nós não temos tanta notícia,
que fala já outra língua diferente. Esta de que trato,
que é geral pela costa, é mui branda e a qualquer nação
fácil de tomar. Alguns vocábulos há nela de que
não usam senão as fêmeas, e outros que não
servem senão para os machos. Carece de três letras,
convém a saber, não se acha nela F, nem L, nem R, coisa
digna de espanto, porque assim não tem Fé, nem Lei, nem
Rei, e dessa maneira vivem desordenadamente, sem terem disto conta,
nem peso, nem medida. Não adoram a coisa alguma, nem têm
para si que há depois da morte glória para os bons e
pena para os maus. E o que sentem da imortalidade da alma não
é mais que terem para si que seus defuntos andam na outra vida
feridos, despedaçados ou de qualquer maneira que acabaram
nesta.
Dimensões da educação
A
diacronia, em termos de educação, gera um impasse e uma
crise. Para fins didáticos, podemos dizer que a educação
é constituída por duas dimensões, ou aspectos,
constitutivas, intrinsecamente vinculadas: forma e conteúdo,
as quais estão atreladas a duas questões básicas,
como ensinar e o
que ensinar. Entretanto, parece haver um
paradoxo instalado entre as duas dimensões, pois utilizamos
procedimentos metodológicos formais a partir de conteúdos
epistemológicos diacrônicamente, ou seja, parece haver
um impasse entre pressupostos metodológicos oriundos da
modernidade aplicados sobre fundamentos epistemológicos
historicamente anteriores a esses procedimentos formais; é,
pois, um problema de ordem diacrônica entre procedimentos
metodológicos e fundamentos epistemológicos. Ou seja,
em linguagem bíblica estamos remendando roupa velha com pedaço
de pano novo, em conseqüência, nas palavras atribuídas
a Jesus, “o remendo novo encolhe e rasga a roupa velha.”<
Parece,
portanto, haver uma incompatibilidade entre procedimentos formais e
os conteúdos em educação. Esse fenômeno
está, parece, na gênese de uma crise sem precedentes na
história da educação; estamos, de fato, no olho
do furacão, para usar uma figura de linguagem.
É
plausível, portanto, afirmar que crise talvez seja, hoje, uma
das palavras mais utilizadas em educação e, igualmente,
em todas as dimensões da vida. Mas, como caracterizar crise?
Que é crise? Numa entrevista concedida a Arnaldo Chain e Pedro
Leitão, o professor Hélio Jaguaribe apresentou uma
descrição bastante precisa sobre o fenômeno:
no
seu sentido mais amplo, a palavra crise – que etimologicamente
significa “ruptura, conflito, luta”, em suas raízes
gregas – exprime uma desconformidade estrutural entre um
processo e o seu princípio regulador. (...) Existe crise, num
processo físico, quando os princípios reguladores
entram em conflito com os processos, que passam a obedecer a outros
sistemas de princípios reguladores. (...) Existe a mesma
aplicação do conceito de crise, no que diz respeito às
condutas referíveis a valores, condutas éticas e
normativas, no sentido axiológico, quando um comportamento
entra em conflito com a norma segundo a qual ele se deveria pautar.
Assim, eu creio que se pode ... defini-la como uma situação
de conflito, de desconformidade, de contradição, entre
o princípio regulador e o processo que esse princípio
regulador era suposto condicionar.
Em
outras palavras, estamos procurando por que
ocorrem determinados fenômenos a partir de metodologias que
procuram responder como
ocorrem. Essa diacronia gera, pois, um impasse, uma crise. Como
escreveu Hannah Arendt, “para além da espinhosa questão
de saber porque razão Joãozinho não sabe ler, a
crise na educação envolve muitos outros aspectos.”
E, alerta a filósofa, “Uma crise só se torna
desastrosa quando lhe pretendemos responder com idéias feitas,
quer dizer, com preconceitos. Atitude que não apenas agudiza a
crise como faz perder a experiência da realidade e a
oportunidade de reflexão que a crise nos proporciona.”
Considerações
finais
Conforme
reconhece a historiografia recente, o Ocidente foi forjado a partir
de três grandes eventos fulcrais: o “primeiro foi
nascimento da razão grega, o segundo a assimilação
da filosofia antiga pela teologia cristã, o terceiro o advento
da razão moderna.”
E, podemos dizer, a crise instaurada se situa nesses processos que,
de uma forma ou de outra, ainda convivem, embora sejam fenômenos
completamente distintos e conflitantes. Daí podermos falar,
como acentuada plausibilidade, da crise instalada na compreensão
do que seja educação.
Em
sociedades “fechadas”, ou “orgânicas”,
organizadas a partir de um padrão cósmico determinado,
o que se deve ensinar não se constitui num problema insolúvel;
cabe a quem ensina compreender adequadamente a ontologia específica
e aplicá-la; é, portanto, um esforço de
inteligência, do intelecto: “Dicendum quod nomen
intellectus sumitur ex hoc quod intima rei cognoscit: est enim
intelligere quasi intus legere.” A
máxima de verdade, instaurada no século X pelo judeu
Isaac Israeli (850-950?), veritas est adequtio
rei et intelectus, é a súmula
fiel da idéia de ciência praticada na Europa de então,
superada apenas no século XVIII, com Kant. Dessa máxima
pode-se deduzir que cabe ao ser humano adequar-se, enquanto criatura
de Deus, portanto rei (coisa criada),
ao intelecto divino. Quanto melhor compreendemos o intelecto divino
mais poderemos saber da verdade das coisas, a essência mesma
dos objetos sensíveis.
De
acordo com Guardini,
O
homem da Antigüidade não ultrapassa os limites do mundo.
O seu sentimento da vida, o seu modo de representação e
de pensamento detém-se no interior da sua estrutura e não
põe a questão de saber o que poderá existir fora
ou para lá dela. Isto origina-lhe, em primeira análise,
uma involuntária autolimitação que receia
ultrapassar determinadas fronteiras, uma vontade enraizada
profundamente num ethos
antigo de permanecer no que lhe foi designado.
Seria o caso, por exemplo, de uma
educação cujo princípio de verdade esteja
atrelado a uma teologia, cuja verdade precede o ato de ensinar: “und,
cum omne bonun sit a Deo et omnis forma, oportet absolute dicere quod
omnis veritas sit a Deo.”
Havia, pois, um horizonte ontológico bem determinado,
específico, a partir do qual a educação retirava
o seu sentido.
Entretanto,
em sociedades pluriculturais e, consequentemente, pluricósmicas,
as questões parecem insolúveis, porque as áreas
a não serem ultrapassadas são tênues e demandam
esforço por parte daquelas pessoas que estão na lide
cotidiana em sala de aula. Hoje, portanto, tateamos entre
inumeráveis fenômenos sociais e temos dificuldade para
compreendê-los, porquanto nossas análises estão
fundamentadas essencialmente em metodologias formais científicas,
oriundas, sobretudo, das proposições comteanas,
mas, pari passu,
assentadas sobre epistemologias ontológicas pré-modernas.
Para as metodologias oriundas da modernidade o importante é
entender os fenômenos e não por
que existem esses mesmos fenômenos, ou
seja, os “cientistas nunca se perguntam a si próprios
por que acontecem as
coisas, mas como elas
acontecem.”
Eis, portanto, as linhas gerais que permearam essas reflexões. ·- ·-· -······-·
Osvaldino Marra Rodrigues
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