Arbil cede expresamente el permiso de reproducción bajo premisas de buena fe y buen fin | Para volver a la Revista Arbil nº 95-96 Para volver a la tabla de información de contenido del nº 95-96 | «Se cumplen 20 años de la Ley Orgánica 9/1985, aprobada por el Parlamento, ratificada por el Rey, y mantenida. tras su alternancia, por los gobiernos del Sistema, con y sin mayorías parlamentarias. Esta ley ha dejado matar cerca de un millón de niños por aborto quirúrgico y varios millones más por aborto químico»
Bioética, Pessoa e Direito (Para uma recapitulação do estatuto do embrião humano) por Mário Emílio Forte Bigotte Chorão O actual debate bioético e biojurídico provocado pelos desafios da “revolução biotecnológica” tem dispensado particular atenção às situações-limite (stati di confine) da vida humana, designadamente ao estatuto do embrião, por outras palavras, ao status do indivíduo concebido (conceptus), mas ainda não nascido (nasciturus). É notório o contraste de opiniões a este respeito, sob a influência de diferentes concepções éticas e jurídicas e de variados pressupostos filosóficos. Não raro, o tratamento daquela crucial e vexata quaestio aparece inquinada por vícios de método, debilidades doutrinais e preconceitos ideológicos, que podem tornar-se causa de graves custos humanos. Pareceu oportuno rever aqui os termos essenciais do problema, embora, forçosamente, de modo muito sumário e esquemático. a | A via do realismo e do personalismo Na abordagem desta questão – e, em geral, no estudo da temática bioética e biojurídica –, temos seguido uma orientação baseada no realismo como atitude originária ou ponto de partida (Anfangspunkt) do espírito, com alcance, não apenas intelectual e teorético, mas existencial e prático. E temos adoptado como modelo ou paradigma de reflexão o personalismo metafísico ou ontologicamente fundado. Esta opção reconhece o primado do ser sobre o cogito e o conhecimento (“ipsae res sunt causa et mensura scientiae nostrae”), da teoria (theoria) sobre a prática (praxis), do ser (Sein) sobre o dever ser (Sollen). Em consequência, antepõe o estatuto ontológico do conceptus ao estatuto deontológico (ético e jurídico). E, coeremente, recomenda, na esteira, ente outros, de V. Possenti, uma metodologia que, perante o “mistério” da génese da vida, privilegie a atitude meditante e contemplativa e evite incorrer no precipitado prescritivismo ou normativismo moral e jurídico. Perspectiva científica e filosófica do embrião Nesta ordem de ideias, impõe-se tentar captar a verdadeira realidade do conceptus na sua expressão empírica e fenoménica e na radicalidade última do seu ser, atendendo à lição das ciências biológicas e da filosofia. Ora, o saber científico atesta, segundo opinião amplamente sufragada e muito autorizada, que, com a fusão dos gâmetas, se inicia a vida de um novo organismo biológico, um indivíduo da espécie humana, autónomo e com identidade genética própria. Essa conclusão não parece prejudicada pela situação desse organismo na fase anterior à nidação (designada, por vezes, ambiguamente, “pré-embrionária”), nem pela hipótese gemelar monozigótica. Por sua vez, a reflexão apoiada na filosofia da natureza e na metafísica permite considerar – conforme a melhor doutrina – que o ser humano embrionário é uma pessoa, ou seja: “rationalis naturae individua substantia (Boécio); “individuum rationalis naturae” ou “subsistens in natura rationali vel intellectuali (Tomás de Aquino); uma unidade substancial corpóreo-espiritual. Em suma, no momento auroral da fecundação, não é uma coisa, mas alguém – um ser pessoal –, que surge na terra dos vivos. A concepção ontológico-substancialista da pessoa Esta tese de identidade pessoal do ser humano embrionário apoia-se no correcto entendimento metafísico da concepção ontológico-substancialista da pessoa. Para o efeito, é indispensável precisar alguns conceitos centrais, como: substância (ousia) – “substância primeira” (sujeito ou substrato, indivíduo subsistente, existente in se e per se, ente dotado do seu próprio actus essendi) e “substância segunda” (essência ou quididade); natureza (não apenas como sinónimo de essência, mas também no sentido de essência de uma coisa enquanto princípio das suas operações). A aquisição do acto de ser em ligação com a essência ou natureza humana ocorre no momento da concepção (constituindo, propriamente, um “facto instantâneo”, e não um “processo”), quando, por obra dos progenitores, é gerado o corpo, e a alma espiritual, sua forma substancial, é directamente criada e infundida por Deus. Com esta animação, logo no estádio zigótico, o corpo é verdadeiro corpo humano, e o conceptusI, ontologicamente, pessoa em acto, cujas faculdades e operações são susceptíveis de ulterior desenvolvimento perfectivo (operatio sequitur esse). A condição ontológica de pessoa não é uma qualidade mensurável, isto é, que se pode ter em maior ou menor medida; pessoa, ou se é por natureza, ou não se é (to be or not to be). Mas as capacidades da pessoa e o seu exercício, isso sim, são variáveis ao longo do ciclo vital. Em suma, desde o início ao termo da vida, mantém-se o status pessoal do ser humano vivo, independentemente dos acidentes e vicissitudes de ordem somática, psíquica e espiritual. A animação do ser humano embrionário Admitimos, como se viu, a hipótese da animação imediata, segundo a qual a alma espiritual está presente no embrião desde o primeiro instante da concepção biológica. Mas a questão tem sido objecto de intensa polémica, com remotos antecedentes históricos e variadas e complexas incidências de natureza científica, filosófica e teológica, em que se enfrentam as teses da animação imediata e mediata. Uma interessante e competente síntese interdisciplinar desse debate é proporcionada pelo livro de Philippe Caspar, Penser l’embryon d’Hippocrate à nos jours. Anotemos, de passagem, que a primeira das referidas teses, objecto de ampla e qualificada aceitação no passado e no presente, não foi acolhida por alguns reputados autores, entre eles, Tomás de Aquino. Pretendendo integrar o dado científico aristotélico na reflexão filosófica e teológica, o Aquinense optou pela explicação da animação mediata: o embrião só receberia a alma espiritual num certo estádio de desenvolvimento e após ter sido animado, sucessivamente, por uma alma vegetativa e por uma alma sensitiva. Esta posição tomasiana suscita algumas dificuldades, designadamente no tocante à articulação entre ordem moral e ordem ontológica e entre as causalidades natural e divina. Não faltam hoje autorizadas versões favoráveis à animação imediata, que se apoiam em renovadas bases embriológicas e usam uma argumentação que se serve de contributos essenciais do magistério filosófico e teológico de S. Tomás. É o caso, por exemplo, dos importantes estudos do mencionado Philippe Caspar e do ensaio de Louise-Marie Antoniotti, O. P., La vérité de la personne humaine. Animation différée ou animation immédiate . Enfim, a alma espiritual ou intelectual, forma do corpo, não é, nem pode ser, eduzida da matéria pela potência generativa dos pais, mas é criada e infundida por Deus, no momento da concepção, e independentemente da exigência de um certo grau de complexidade do organismo biológico. Ou seja, a alma racional não é produzida por transmutação da matéria, mas por directa criação divina. Ela está presente, desde o início da vida, no organismo embrionário, embora não sejam ainda aparentes os seus actos próprios, como o exercício do pensamento ou da vontade. A alma humana é, então, como “un faible feu […] impuissant à user pour l’instant de ses forces” (Erasmo), ou “un feu qui ne brille pas encore de son plein éclat”. Corpo humano – ser humano – indivíduo humano – pessoa Em resumo, à luz da concepção ontológico-substancialista, parece legítimo enunciar as seguintes asserções: onde está o corpo humano (vivo), aí está a alma espiritual; onde está o produto da concepção, está o indivíduo humano; onde está o indivíduo humano, está a pessoa. Podemos considerar como equivalentes os termos ser humano, indivíduo humano e pessoa humana, e devemos reconhecer a coextensividade entre ser humano e pessoa (todos os seres humanos são pessoas). Para o personalismo metafisicamente fundado, a pessoa está presente ab ovo / ab origine – logo desde a concepção –, por certo em gérmen, mas já substancialmente (como sujeito existente in se e per se, de natureza corpóreo-espiritual). O embrião humano à luz da Revelação divina e do Magistério da Igreja A percepção da identidade pessoal do embrião humano, a que pode chegar-se pela via da pura racionalidade natural, é significativamente confirmada pelas fontes da Revelação divina, pelo Magistério e pela prática da Igreja católica e pelos ensinamentos da teologia cristã. Faremos, a este respeito algumas brevíssimas referências. O dogma da Imaculada Conceição mostra que a Virgem Maria foi preservada de toda a mancha do pecado original “no primeiro instante da sua concepção”, isto é, quando foi constituída como pessoa humana, único sujeito capaz de contrair o pecado e de receber a Graça. Naquele momento foi gerado o corpo de Maria no ventre materno, e criada e infundida por Deus a sua alma espiritual (animação imediata). Por sua vez, no mistério da Encarnação, com a fecundação virginal – a concepção de Cristo com a intervenção do Espírito Santo – coincide a assunção, pelo Filho de Deus, da natureza humana. Permanecendo verdadeiro Deus, Ele torna-se verdadeiro homem – o que supõe a concepção de um corpo humano e a sua animação racional (imediata). Estes dogmas (também o da Trindade) têm dado azo a uma frutuosa cooperação entre a fé e a razão, a teologia e a filosofia, com vantagem simultânea para o discernimento da verdade natural acerca da pessoa humana e para o aprofundamento dos grandes mistérios cristãos. São relevantes outras indicações no sentido de que o homem / a pessoa humana chega à existência no momento da concepção e que é contemporânea desta a criação e infusão divina da alma espiritual. Assim, certas referências evangélicas a João Baptista: “ele será cheio do Espírito Santo já desde o ventre da sua mãe” (Lc. 1, 15); no seio materno, o Baptista estremeceu (LC 1, 42) e “exultavit in gaudio” (Lc 1, 44), quando Isabel ouviu a saudação de Maria. Embora concebido em pecado – o pecado original –, o Precursor foi santificado, ainda antes de nascer, pela presença de Jesus, que sua Mãe, quando da visita a Isabel, também trazia no ventre. É igualmente favorável ao reconhecimento do status pessoal do conceptus a prática, seguida na Igreja católica e regulada pelo direito canónico (cf. cân. 871 do C.D.C.), do baptismo dos fetos abortados, se estiverem vivos. O sujeito idóneo do sacramento do baptismo é apenas o homem, devendo, pois considerar-se como ser humano o feto, em qualquer fase, a partir da concepção. Entende-se que o feto contraiu o pecado enquanto pessoa, isto é, sujeito dotado de corpo e de alma racional, criada no início da sua vida biológica. A ideia de que o nascituro será verdadeira pessoa é ainda apoiada por vários documentos recentes do Magistério eclesiástico, como a Instrução Donum vitae (22.2.1987) da Congregação para a Doutrina da Fé, o Catecismo da Igreja Católica (11.10.1992) e a Encíclica Evangelium vitae (25.3.1995) de João Paulo II. A dignidade da pessoa humana A condição pessoal do ser humano implica uma eminente dignidade, a qual se pode justificar racionalmente, a partir do estatuto ontológico da pessoa, e reforçar, de modo singular, à luz da fé, com base na Palavra de Deus. S. Tomás, ao definir metafisicamente e pessoa, considera que ela é o que há de mais perfeito (perfectissimum) e digno (dignissimum) em toda a natureza, porque é um ser subsistente (subsistens, per se existens), dotado de uma alma espiritual e imortal, que torna o homem mais semelhante a Deus do que às outras criaturas. Em suma, cada pessoa em concreto é um sujeito único e irrepetível, fim em si mesmo, com uma dignidade incompatível com a sua instrumentalização e coisificação. As razões desta superior nobreza, consideradas, não apenas no plano natural, mas na perspectiva da fé, merecem um desenvolvido tratamento por parte do Catecismo da Igreja Católica. Além de muitas outras referências dispersas ao longo do texto, consagra-lhes expressamente todo um capítulo (“A dignidade da pessoa humana”): nºs 1700-1876. O homem – cada homem singular – é um ser criado por Deus à Sua imagem (imago Dei), redimido por Cristo e destinado à bem-aventurança eterna (beatitudo), plenitude da felicidade. Já a simples razão natural está em condições de por si descobrir a dimensão religiosa como elemento constitutivo essencial da pessoa, que a põe em relação com Deus. Inclinado por natureza à verdade, o homem tem o “desejo natural de ver Deus” (desiderium naturale videndi Deum”), Fonte de todo o ser, Fim último de toda a realidade, e Pessoa Primeira. Mas só o Logos divino pode revelar a verdade integral acerca do homem, do seu destino supratemporal e dos meios necessários para entrar em comunhão com Deus. Enfim, o personalismo, se adoptar, realisticamente, este dilatado horizonte gnosiológico, apoiando-se na razão e na fé, na filosofia e na teologia, fica habilitado a um conhecimento mais perfeito da realidade da pessoa humana. “Quem vê mais ampla e profundamente tem mais razão”. A essa luz, “brillano valori e profondità che resterebbero altrimenti nel buio o nella penombra”, para usar palavras de H. U. von Balthasar, em comentário ao magistério de Romano Guardini sobre a “katholische Weltanschauung”. O estatuto ético do embrião: agir “secundum naturam” Posta agora a questão do estatuto ético do embrião humano (qual o comportamento que moralmente lhe é devido?), diremos, na lógica dos pressupostos realistas e personalistas assumidos, que o dever ser tem de pautar-se pelo ser. Quer isto dizer, antes de mais, que o sujeito moral deverá agir neste caso, como na generalidade das situações da vida, segundo a sua natureza (secundum naturam), ou seja, de modo a ordenar as suas acções para o fim do homem enquanto homem (in quantum est homo), e, portanto, para a sua perfeição, condição da felicidade. Aí reside o bem moral. Condensa-se, por vezes, esta normatividade moral em fórmulas como: “homem, torna-te naquilo que és”, ou “age para te realizares plenamente como homem”. O primeiro princípio universal da razão prática, que pertence à experiência do senso comum, expressa-se no dever de fazer o bem e evitar o mal (bonum faciendum, malum vitandum) e coincide, no fim de contas, com a apontada exigência de caminhar na direcção da perfeição humana. Fundada na verdade ontológica do ser humano, a ordem moral manifesta-se na razão que regula o agir em função do seu fim natural (recta ratio). O dever ser, por isso, radica no ser (das Sollen gründet im Sein), a ontologia projecta-se, por assim dizer, na deontologia. Será moralmente bom o acto ordenado ao fim (telos) correspondente à natureza e dignidade pessoais do agente. Ao contrário, será ilícito o comportamento antinatural ou desnaturado (contra naturam), como o do pai que maltrata o filho, ou do médico que provoca intencionalmente a morte do paciente a seu cargo. Que dizer, à luz deste critério, da manipulação experimental e da destruição de embriões vivos? Convém advertir que, em última instância, a natureza humana com a sua intrínseca teologicidade, e, consequentemente, a ordem moral, remetem para Deus, criador do homem e seu fim e bem supremo e absoluto. À margem da existência de Deus (etsi Deus non daretur) não parece possível dar uma verdadeira fundamentação e garantir a eficácia da moral. Será assim, por exemplo, no existencialismo ateu sartriano: “il n’ya pas de nature humaine, puisqu’il n’y a pas de Dieu pour la concevoir”; logo, o homem “est non seulement tel qu’il se conçoit, mais tel qu’il se veut”, ele “sera d’abord ce qu’il aura projeté d’être ”. O estatuto ético do embrião: reconhecimento da identidade pessoa A definição do estatuto ético do embrião impõe outra consideração, aliás, estreitamente ligada à do parágrafo anterior. De um modo geral, como se referiu, é exigido ao homem, se quer proceder rectamente na esfera moral, que aja de um modo racional, em conformidade com os imperativos decorrentes da sua natureza. Ora, desta exigência fundamental deriva, como forçoso corolário, que o sujeito moral deve ter em conta os seres com que se relaciona e tratá-los segundo a respectiva natureza e os fins ínsitos nela. Rosmini, discorrendo sobre a fundação da ética, alude à necessidade de “riconoscere l’essere nell’ordine suo” e formula, a propósito, o seguinte incisivo princípio: “Ama l’essere dovunque lo conosci, in quell’ordine ch’egli presenta alla tua intelligenza”. Pois bem, aplicando esta doutrina ao nosso problema, resulta o dever de advertir a presença do ser embrionário e de o respeitar como pessoa humana (mesmo no caso de eventual dúvida acerca da sua identidade pessoal). Esse respeito tem de entender-se num sentido forte, que inclui, não apenas o dever de não causar dano (neminem laedere), mas também o de dispensar, positivamente, ao conceptus, a atenção e os cuidados que ele merece, atentas a sua natureza e dignidade, bem com as circunstâncias particulares da sua extrema fragilidade e vulnerabilidade. Cabem aqui, os imperativos da justiça (suum cuique tribuere) e do amor de benevolência. A natureza humana tem, assim, como se vê, uma dúplice relevância como critério de normatividade, ao referir-se ao próprio sujeito da acção e, também, no nosso caso, ao ser embrionário. A conduta ilícita (p. ex., a occisão de embriões) será contrária à natureza de um e de outro. A fundamentação realista do estatuto ético do embrião: o personalismo ontológico Assentamos, pois, o estatuto ético do embrião humano em pressupostos realistas, de que faz parte o reconhecimento da cognoscibilidade de princípios morais objectivos e dos respectivos fundamentos metafísicos (cognitivismo ético e metafísico). O cerne ou “núcleo duro” ontológico desta concepção, fundante da ordem moral, reside, precisamente, na natureza humana (como essência e princípio operativo da pessoa). Com esta se liga, íntima e necessariamente, o primeiro princípio prático – “bonum faciendum, malum vitandum” –, consistindo o bem moral na perfeição da pessoa, enquanto seu fim natural ou essencial. Homem, pessoa e natureza humana, tais como aqui se entendem, não exprimem simples factos empíricos e dados sensíveis, mas realidades com um denso conteúdo ontológico e teleológico, que trazem já em si uma mensagem moral (“vive como homem”). Por isso, esta fundamentação do dever moral no ser finalístico da pessoa não pode ser confundido com uma explicação de tipo naturalístico e biologístico. E não a atingem os argumentos da chamada “lei de Hume” (Hume’s law) ou da “falácia naturalista” (naturalistic fallacy), frutos do separatismo – a “Grande Divisão” – entre mundo fenoménico e mundo numénico, entre ser (Sein, is) e dever ser (Sollen, ought). A fundação da moral na realidade ontológica da pessoa humana não representa, na verdade, nenhum indevido salto lógico, mas reflecte, tão-só, a dimensão normativa ínsita na natureza do homem. Esta versão do realismo ético clássico inclui, assim, como componente essencial, o reconhecimento da existência, da lei moral natural, que ordena o agir numa direcção perfectiva, segundo as inclinações e finalidades inscritas na natura hominis. A formulação primordial dessa lei, por assim dizer, o seu “preâmbulo”, é a do referido princípio prático – “deves fazer o bem…”. Este desdobra-se depois, noutros princípios com maior grau de determinação conforme as tendências e bens concretos inerentes à natureza humana e ao desenvolvimento da pessoa no sentido da sua perfeição. Tomás de Aquino e os seus seguidores explicitam essas inclinationes naturales do homem: à conservação da vida; à união sexual e educação dos filhos; ao conhecimento da verdade; à vida social. Por sua vez, a Bíblia transcreve no Decálogo – como deveres universais – exigências básicas da lei natural. O Decálogo – convém notar – “não é propriedade privada dos cristãos ou hebreus”, mas “uma altíssima expressão da razão natural que, como tal, coincide também largamente com a sabedoria das outras grandes culturas”. Por isso, “tomar novamente como referência o decálogo poderia ser essencial para a purificação da razão, para um novo relançamento da recta ratio”. O conhecimento destes deveres morais é acessível à razão natural (conhecimento por conaturalidade ou congenialidade, vivencial, conceptual…). Arrancando da experiência primária do senso comum (sensus communis), de que fazem parte as certezas básicas e universais do homem, esses deveres fundamentais, são objecto, também, obviamente, de aprofundamento reflexivo por parte do saber filosófico. A sua cognoscibilidade natural não significa, porém, que a sua apreensão seja isenta de dificuldades e erros. Por isso, é conveniente que venha a luz da Revelação em auxílio da razão humana para ajudar o homem na senda do bem e da salvação. Em suma, a orientação ética anteriormente esboçada a propósito do estatuto do embrião humano inscreve-se, plenamente, no quadro do modelo ético (ou bioético) presonalista, baseado na consideração ontológica da pessoa humana, e identificado como personalismo ontológico ou ontologicamente fundado. Supõe, este, a justificação racional dos juízos de valor moral com base na dimensão ontológica, na realidade essencial e natural, da pessoa, Esse modelo é hoje proposto por um conjunto significativo de autorizados especialistas da bioética e do biodireito. Tal como o entendemos, ele baseia-se no reconhecimento da legitimidade da ética racional, rejeita a indevida “confessionalização” do debate bioético e afasta toda a tentação fideísta. Mas, do mesmo passo, refuta as pretensões do racionalismo e do laicismo – que impregnam propostas apresentadas sob o rótulo de “bioética laica” – e admite as vantagens da abertura da razão natural à fé, e da colaboração entre a ética filosófica e a teologia moral, na linha da orientação preconizada por João Paulo II nas encíclicas Veritatis splendor (6.8.1993) e Fides et ratio (14.9.1998). Uma coisa se deve ter como adquirida e segura: a ética cristã não recusa as verdades da moral natural, antes assume, reforça e sublima as suas exigências normativas (gratia non tollit naturam, sed perficit). Assim teria de ser, ao ver em Cristo o verdadeiro fundamento e regra do agir, e ao fazer do “mandamento novo” (“amai-vos uns aos outros como Eu vos amei”) e da “regra de ouro” (“fazei aos outros o que quereis que eles vos façam”) a chave do seu “código moral”. Por isso, não é despiciendo, do ponto de vista cristão, que a ética, em geral, e a bioética, em particular, procurem escutar a Palavra de Deus. Que terá esta para nos dizer a propósito do respeito devido à frágil criatura que é o ser embrionário, fruto singularíssimo da cooperação divino-humana? O estatuto jurídico do embrião: o reconhecimento da personalidade e da capacidade como exigência do direito natural Segundo a lógica do personalismo ontológico e da concepção realista do direito (o ius é id quod iustum est, a começar pelo iustum naturale), o estatuto jurídico do embrião humano terá de reflectir os imperativos da justiça (suum cuique tribuere), primordialmente, os que decorrem da própria natureza pessoal do conceptus (ex ipsa naturae conceptus / nasciturus). Ou seja, no ser humano concebido reside o fundamento do dever ser jurídico, do seu estatuto perante o direito. Assim, antes de mais, deverá ser reconhecido ao nascituro, como primeiro atributo, a personalidade jurídica, por conseguinte, a condição de sujeito de direito. Para a concepção realista do direito – de base personalista e jusnaturalista –, a personalidade jurídica (singular, ou do indivíduo humano) acompanha a personalidade humana em sentido natural ou ontológico. Ubi persona naturalis, ibi persona iuridica. Assim, todos os indivíduos humanos, desde o início ao termo do seu ciclo vital, portanto, também o conceptus, são (ex natura rerum), além de pessoas em sentido ontológico, pessoas jurídicas. Em defesa deste fundamento realista e metafísico da personalidade jurídica singular, são de referir, entre outros, os valiosos contributos do espanhol Javier Hervada, da colombiana Ilva Myriam Hoyos Castañeda e da italiana Laura Palazzani. Estreitamente conexionado com esse fundamento da personalidade jurídica, está a tese concepcionista, segundo a qual o indivíduo humano adquire a qualidade de sujeito de direito no momento da concepção, e não apenas, como pretende a tese natalista, com o nascimento. Assegurada ao ser humano embrionário a personalidade jurídica – como dimensão inerente à personalidade natural –, dela decorre automaticamente o reconhecimento da capacidade de ser titular de direitos (capacidade jurídica do gozo). Só que, enquanto a personalidade jurídica é um atributo inquantificável (não se é, mais ou menos, mas, ou se é, ou não, sujeito de direito), a referida capacidade pode ser maior ou menor, consoante as circunstâncias. Ainda assim, não pode deixar de abranger, no caso de conceptus, aqueles direitos fundamentais exigidos pela própria natureza do sujeito (direitos naturais), a começar pelo direito à vida. Mas vários outros direitos, com título natural ou positivo, cabem naquela capacidade (como os relativos à integridade física, à identidade genética, à honra, ao estabelecimento da filiação e à representação jurídica, a alimentos, à aquisição de bens por doação e sucessão “mortis causa”, ao ressarcimento de danos). Deve dizer-se que o actual debate biojurídico proporciona uma excelente oportunidade para rever, em termos realistas, a questão do fundamento e da aquisição da personalidade jurídica, vencendo o “sono dogmático” do formalismo e do legalismo. Bem assim, esse debate constitui um feliz ensejo para aproximar – de modo inovador, dinâmico e progressivo – o ius do bios e para abrir promissoras e humanizadoras perspectivas ao “retorno do direito natural”. Nótula sobre a experiência jurídica histórica a respeito do embrião humano A equiparação, não só ontológica, mas também, em certos termos, jurídica, entre nascido e nascituro, o reconhecimento a este da personalidade jurídica e, em maior ou menor medida, da capacidade do gozo de direitos, a tutela pré-natal do direito à vida – tudo isso tem raízes consideráveis na experiência jurídica do passado. Assim, desde o direito romano até à codificação moderna civil (que, de modo não isento de ambiguidade, apesar da sua opção natalista quanto à aquisição da personalidade, reconhece a titularidade de certos direitos ao conceptus) e, obviamente, penal (ao punir o aborto como crime contra o direito à vida das pessoas). Esses antecedentes e testemunhos históricos adquirem hoje renovado interesse no âmbito bioético e biojurídico e dão azo a interessantes e instrutivas pesquisas. É o caso, por exemplo, das empreendidas directamente pelo romanista Pierangelo Catalano, da Universidade de Roma “La Sapienza”, ou sob seu impulso, e centradas no tema do estatuto do nasciturus no direito romano e na codificação moderna, particularmente, nos ordenamentos da área latino-americana. Neste âmbito, tem merecido especial e justificada atenção o tratamento jurídico do conceptus como “pessoa por nascer”, adoptado pelo brasileiro Teixeira de Freitas e, na sua peugada, pelo argentino Vélez Sarsfield. Vêm-se sucedendo, nas últimas duas décadas, elaboradas e fundamentadas propostas no sentido do reconhecimento da personalidade e capacidade jurídica do nascituro e da formulação da sua “carta de direitos”, propostas que põem em causa disposições dos códigos civis, como as dos artigos 1º (Itália) e 66º (Portugal). Num contexto amplamente adverso à personalidade jurídica do nascituro e aos seus direitos fundamentais, incluído o direito à vida, afloram, por vezes, esparsas notas positivas. Assim, o art. 1º da vigente lei italiana sobre procriação artificial, que se refere expressamente aos “diritti di tutti i soggetti coinvolti, compreso il concepito”, sugerindo, portanto, a equiparação dos direitos do embrião aos das pessoas já nascidas. Em nome de ideologias bioéticas e biojurídicas permissivas, pretendeu-se questionar essa e outras disposições da lei através de um recente referendo (Junho/2005), malogrado por falta de quorum. Influência do “pensamento fraco” no estatuto do embrião É muito diferente do anteriormente proposto o estatuto do embrião humano aos olhos dos que caminham pela via do pensiero debole, do relativismo ético e do positivismo jurídico. A atitude ontofóbica e antimetafísica característica do “pensamento fraco” não permite ver o embrião à luz percuciente do personalismo ontologicamente fundado e, portanto, da concepção metafísica substancialista. Fica-se por abordagens de tipo empirista e funcionalista, que fazem depender a condição pessoal do indivíduo humano da verificação de certas manifestações de desenvolvimento biológico e/ou do exercício de determinadas operações – manifestações e operações escolhidas segundo critérios variáveis e discutíveis. O irrealismo e subjectivismo que caracteriza esta opção pode atingir o seu extremo se, porventura, se entender deixar o reconhecimento da identidade pessoal do nascituro à decisão arbitrária e aleatória dos progenitores ou de outras entidades. Enfim, o agnosticismo metafísico e o cientificismo (que têm uma conhecida versão materialista em Jean-Pierre Changeux, autor de L’Homme neuronal e ex-presidente da Comissão francesa de ética para as ciências da vida e da saúde), incapazes de captar a dimensão integral e radical do ser humano, a sua unidade substancial corpóreo-espiritual (não têm olhos para ver o essencial!), recusam o status da pessoa a certos homens – por nascer (nondum nati) ou já nascidos (nati, nondum mortui). Acresce que o empirismo antropológico, embora possa proclamar o respeito da dignidade humana – convertido, no dizer de V. Possenti, num princípio “ecuménico” –, faz dele um mero tópico retórico, insubstancial e debilitado na sua eficácia prática. Por tudo isso, é necessário e urgente ultrapassar a “leitura” meramente científico-positiva do homem (limitada ao comment do “fenómeno humano”), e procurar atingir, na radicalidade da perspectiva metafísica (extensiva ao pourquoi último), a substância (primeira e segunda) da pessoa, e, por conseguinte, a alma espiritual, raiz do acto de ser, forma do corpo orgânico e princípio das operações humanas. Tem razão o filósofo Marie-Dominique Philippe, ao escrever: “seule la redécouverte d’une authentique philosophie première de ce qui est, découvrant la substance (l’ousia) et l’être-en-acte (l’energeia) et, grâce à ses deux principes, découvrant le problème de la personne humaine au niveau de l’être et de l’esprit, peut nous aider à dépasser ce positivisme et redonner à l’intelligence humaine toute sa dimension”. Esta linguagem será certamente inaudível para a cultura dominante, impregnada de cientismo, tecnicismo e pragmatismo. Os arautos dessa cultura tenderão a considerar ingénuas as pretensões do realismo da filosofia do ser e estarão mais prontos a dar prioridade ao “choque tecnológico” do que aos apelos da sabedoria (sophia) e da prudência (phronesis). Relativismo ético e estatuto moral do embrião Se se desliga o estatuto moral do embrião de fundamentos objectivos alicerçados no ser da pessoa humana, esse estatuto fica à mercê de opções éticas várias, que põem em causa a integridade física e a dignidade do conceptus. Estas opções correspondem, de um modo geral, nos dias de hoje, às tendências do não-cognitivismo ou agnosticismo ético, do decisionismo e do relativismo moral (“à chacun sa vérité, selon sa volonté”), imperantes na cultura contemporânea e amplamente responsáveis da sua deriva niilista. Tais tendências reflectem-se, como é natural, em diversos “modelos bioéticos”, assumidos por certa “bioética laica” e contrastantes com a proposta do personalismo ontologicamente fundado, v.g.: o liberal-radical (absolutiza a “liberdade”, entendida sobretudo em sentido negativo); o utilitarista (baseado no cálculo custo-benefício); o do sociologismo historicista (propugnador de uma moral descritiva e evolutiva, determinada pela práxis social); o inspirado pelo cientismo e o tecnicismo (tende a considerar moralmente lícito o que é científica e tecnicamente possível, segundo critérios de “progresso” e de eficácia). À sombra desses “paradigmas bioéticos” têm sido justificadas práticas de congelamento, manipulação experimental e destruição de embriões, de procriação artificial heteróloga, de eutanásia activa e passiva, de aborto, em termos mais ou menos permissivos, etc.. O mesmo decisionismo e relativismo ético vem favorecendo, por outro lado, uma nociva deformação da ideia de objecção (e liberdade) de consciência: em vez de interpretada à luz de critérios morais objectivos (“objecção da consciência”), é entendida em termos de “consciencialismo” subjectivista e decisionista (“objecção de consciência”), com a consequente desvalorização da sua função como dever de salvaguarda da ordem moral. Compreende-se que autores de diversos quadrantes intelectuais, inquietos com as debilidades e os custos humanos do relativismo, se interroguem sobre a hipótese de a “natureza” servir como medida e norma do agir. Assim, por exemplo, J.- P. Changeux e P. Ricoeur, e, mais recentemente, Habermas e Francis Fukuyama. Obviamente, os termos em que a questão é equacionada e as respostas que recebe dependam muitos dos pressupostos filosóficos de que se parte, do conceito de “natureza” adoptado, enfim, do reconhecimento, ou não, de uma “ordem natural das coisas”. Legalismo positivista e estatuto jurídico do embrião O deficit personalista – isto é, do realismo personalista e jusnaturalista – projecta-se também, negativamente, no estatuto jurídico do nascituro, quanto ao reconhecimento da personalidade e da capacidade. Será o legislador que decidirá da sua atribuição. E poderá acontecer – e acontece, de facto – que as negue ao ser humano nondum natus, decretando que este nullum caput habet, mas, ao mesmo tempo, as confira aos animais, às árvores, etc.. Se não se atender ao fundamento natural e metafísico da subjectividade e capacidade jurídicas do conceptus, acabarão por prevalecer, a seu respeito, soluções ditadas por critérios positivistas, formalistas e utilitaristas. A lei poderá deixar à margem verdadeiros direitos humanos ou naturais básicos do nascituro – como os direitos à vida e à integridade física –, ainda que, porventura, tutele, de algum modo, interesses ou bens a ele respeitantes. A evolução jurídica recente, nomeadamente no âmbito do ordenamento português, levou a essa situação. É certo que o direito à vida está consagrado como direito fundamental na Constituição (art. 24º), que declara, solenemente, a inviolabilidade da vida humana. Apesar disso, e da proclamação constitucional dos princípios da dignidade da pessoa humana (art. 1º) e da igualdade perante a lei (art. 13º), tem-se entendido que a vida pré-natal não é, necessariamente, um direito na titularidade do conceptus, mas tão-só um “bem” ou “valor”, que, por determinação do legislador ordinário – como no caso da chamada “interrupção voluntária da gravidez” – poderá ser sacrificado a interesses reputados prevalentes (a vida, a saúde, a honra da mãe, etc.). Ignora-se, assim, a personalidade natural do nascituro, como se pudesse haver “vida humana” sem sujeito humano vivente. E põe-se em causa a sua personalidade jurídica, tanto mais, alega-se, que a lei civil (ordinária) faz depender esse atributo do nascimento com vida (art. 66º do C. Civil) – como se a interpretação das normas e dos princípios fundamentais da Constituição houvesse de fazer-se à luz da lei ordinária… É evidente que, por esse ínvio caminho, pretendeu-se, sobretudo, abrir as portas à legalização do aborto, que, uma vez acolhido intramuros da cidadela jurídica, tende a ganhar, progressivamente, maior espaço. Em suma, este processo denota, precisamente, a falta de uma correcta e sólida fundamentação do direito fundamental à vida. Partindo de uma perspectiva jurídica relativista e positivista, Norberto Bobbio opina que “ciò che importa non è fondare i diritto dell’uomo, ma proteggerli”. Mas a isto podemos replicar que, ao contrário, “a questão fundamental dos direitos fundamentais é a do seu fundamento”. À míngua de um bom fundamento, há o risco sério de que não seja boa a protecção dos direitos naturais do homem, como os factos demonstram exuberantemente. Antipersonalismo e crise do Estado de Direito e da democracia Pode agora afirmar-se que o agnosticismo metafísico, o relativismo ético e o positivismo jurídico se congregam para dar ao homem concebido, mas não nascido (e, também, ao natus nondum mortuus), um trato desumano, antipersonalista, contrário às exigências elementares da natureza e dignidade da pessoa. Não se lhe reconhece a personalidade jurídica, nem se tutelam devidamente os seus direitos básicos, desde logo, os direitos à vida e à integridade física. Esta situação contribui para a actual crise do Estado de Direito e da democracia. A aprovação de leis permissivas, clamorosamente imorais e injustas (“auctoritas non veritas facit legem”, segundo a fórmula hobbesiana), desvaloriza o Estado de Direito entendido como Estado de bem comum (“ordinatio rationis ad bonum comune” é a lei, na versão tomasiana), de justiça e de legitimidade. E faz com que a democracia, sob o império absoluto do princípio maioritário, se reduza a pura forma ou técnica (democracia formal, processual ou técnica) axiologicamente neutra ou vazia (“democrazia vuota”). Neste sentido apontam, cada qual a seu modo, por exemplo, os “modelos democráticos” propostos por Kelsen e Rorty e, o que é mais preocupante, os factos da experiência política contemporânea das democracia liberais. Ora, essa experiência traz consigo a ameaça de degenerescência do Estado democrático numa nova forma de totalitarismo, enquanto a ordem (melhor, a desordem) político-jurídica homologa, e, mesmo, incentiva, práticas de coisificação e, em última instância, de aniquilamento do homem (a lembrar o título, The Abolition of Man, de um pequeno-grande ensaio de C. S. Lewis). •- •-• -••• •••-• Mário Emílio Forte Bigotte Chorão Entre os importantes contributos da doutrina brasileira, salientam-se os numerosos trabalhos da professora da Fac. de Direito da Univ. de São Paulo Silmara Chinelato e Almeida, v.g.: Tutela Civil do Nascituro, Saraiva, São Paulo, 2000. | | Para volver a la Revista Arbil nº 95-96 Para volver a la tabla de información de contenido del nº 95-96 La página arbil.org quiere ser un instrumento para el servicio de la dignidad del hombre fruto de su transcendencia y filiación divina "ARBIL, Anotaciones de Pensamiento y Crítica", es editado por el Foro Arbil El contenido de estos artículos no necesariamente coincide siempre con la línea editorial de la publicación y las posiciones del Foro ARBIL La reproducción total o parcial de estos documentos esta a disposición del público siempre bajo los criterios de buena fe, gratuidad y citando su origen. | Foro Arbil Inscrita en el Registro Nacional de Asociaciones. N.I.F. 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